sábado, 25 de junho de 2011

SOLDADO FEITO por Filipe Raimundo


SOLDADO FEITO


De mim fizeram
Um soldado e me mandaram
P'rás terras de ninguém,
Lutar com alguém
Que não conheço
E não odeio.

De mim fizeram
Aquilo que agora sou:
Máquina de lutar,
Homem que não pode pensar.

De mim fizeram,
Um soldado e me impuseram
Condição de matar,
Para satisfazer ambições de glória
De homens sem razão.

De mim fizeram
Um soldado sem história,
Mais um soldado sem história.

Fizeram.
São eles que fazem tudo.
Fizeram soldado mudo
E deram-me uma espingarda.

Fizeram
um robot e me disseram:
“Vai para a guerra matar,
Que quando a guerra acabar,
Nós damos-te uma medalha.”

E deram-me,
Um uniforme e um número
Que é a minha identidade,
E disseram-me:
“Agora não tens idade,
Não tens nome,
Não tens nada,
A não ser o corpo pronto
Para receber uma bala.”



Filipe Raimundo
















quinta-feira, 23 de junho de 2011

AS SOMBRAS ESCONDIDAS de José Felix



as sombras escondidas


como um bailado clássico
a espuma da folhagem
reinventa silêncios
em orações de sul.

são tão frágeis os ramos
que a seiva nobre deixa
feridas nas palavras
breves, graves, no tronco
solitário do chão.

dança o tempo no olhar
e o vento chove a água
nas sombras escondidas.


Jose Félix




domingo, 12 de junho de 2011

O QUE SOU? Por Filipe Raimundo


O que sou?

Tu meu amigo
Que vens não sabes de onde
E vais
Não sabes para onde
Em busca do que não tens…
Permite-me que te acompanhe
Pois também procuro o mesmo.

Eu…camarada
Procuro há muitos milénios
O que sou…e de onde vim.
E tu também és assim…
Tens a condição humana
De nunca estar satisfeito;
E o muito que tens feito
Para te poderes defenir
Só te abre novos abismos
Dde que não podes sair.

Mas não te digo que pares
Na marcha que iniciaste.
Vai…Corre pelas calhas da vida
Que eu correrei a teu lado,
E assim serei mais um louco,
Que o faz para não estar parado.
Farei perguntas aos deuses
Só para não ficar calado,
E sentirei a revolta
De não estar realisado;
E um dia morrerei
Com esta pergunta nos lábios:
O que fui?
Ou: O que sou?
De onde vim?
Para onde vou?
E a resposta não virá.
E tu também morrerás,
E todos hão-de morrer
Sem que venham a saber
O que foram
Ou porque o eram.
E o esforço que fizeram
Não lhes deu compensação.

Por isso presta atenção!
Vive a vida intensamente,
Mas vive-a…Vive-a mesmo!
Vive-a tão ferozmente
Que a sintas dentro de ti
A borbulhar…A ferver.
A vida….Essa vida que medimos
Em séculos ou em segundos
Segundo a pressa que temos,
Essa vida meu amigo,
Essa vida vale a pena ser vivida.
Acredita! Crê em mim
Pois não te estou a mentir.
Viver…meu amigo
Viver é muito mais do que existir.


Fortios, Janeiro de 2011

Inédito - de J.T.Parreira

Um pássaro fractal


sai da parede
um campo de algodão enche
os nossos ouvidos de silêncio
ao lado o rio parte
o estado dos olhos e da alma
do Narciso
a olharem de través
dois olhos num umbigo
e num espelho uma mulher que ocupa
os quatro cantos
Magritte se esfuma num cachimbo
e um trapézio
num corpo de ave.
que esvoaça de fugida.

24/5/2011

(c) J.T.Parreira (inédito)


Do Outro Lado da Fala por José Felix


do outro lado da fala

do outro lado da fala
a infância é um duende
na exploração dos pássaros.
caminha sub-reptícia
no segredo das árvores
acariciando ecos
suspensos como frutos
que vão caindo, ou perdem-se
no sabor da linguagem
feita literatura.
é aí que se revive
a cor das plantas íntimas
a sombra dos objectos
e até a ressonância
dos nomes que não moram
nos corpos que vestiram.
do outro lado da voz
a língua é um desejo
no halo de um sol de bruma.


in "do outro lado da fala"


Jose Felix