domingo, 19 de abril de 2020

TRÍPTICO


é quando me embriago nos mamilos
já turva a voz que me lancina o peito
eu ouço o som dos pássaros
são eles que despertam a voracidade dos dedos
na insónia de um corpo
que prende a noite nas escarpas da vigília
e o desejo, ó o desejo, é a dor
que se atravessa na literatura
faço como baudelaire
e, além das três escolhas
procuro outras tantas e mais de mil
para que pereça sem a mais leve memória
de mim e dos outros
*
Nos dedos há a combustão possível.
Na carta velha as palavras doem
no esquecimento da emoção da frase
e no relâmpago do tempo soa
o trovão de uma tempestade fria.
Há milhares de brincadeiras femininas
que se colam ao filme, e de tão cegas
na luminosidade dos holofotes
as personagens constroem figuras
que são as simples sombras irrequietas.
Há, claro, a possibilidade lúdica
da intervenção da escrita literária
que persegue o desejo do pão claro
na seara semeada no próprio tempo
*
Na subversão da escrita
o desejo não é uma falácia.
Se escolho o texto, escolho a emoção
que persegue a frase transfigurada.
a mulher é sintagma, flor-palavra
poema-árvore, erotismo, ruga-de-tronco
floração para todas as estações.
Toco no texto, acaricio o corpo;
na escrita leio a forma
da escultura das letras, o desenho
com a voz que permanece no rosto.
Na leitura das mãos, o nome é a substância
que lavra o texto.

José Félix

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